21 de janeiro de 2009

Enquanto sofre, deixa de amar?

Lá vai eu pra fila do sus, só há uma coisa a fazer nessa três horas esperando um médico: pensar no sentido da minha existência( ainda não cheguei a conclusão nenhuma, mas ainda tem o retorno)

Eu juro meu deus que se um dia eu for trabalhar em um hospital público, vou chegar na hora.

O mais interessante são as descrições das doenças, cheguei a uma resolução: não vou esperar médico chegar! Vou sentar lá fora, converso aqui, converso ali e já saio com o diagnóstico, a prescrição... Só mando o doutor, carimbar!

Não sei se é a fragilidade, ou são as longas horas de cumplicidade, mas as pessoas falam muito, curioso foi perceber como na fala das pessoas , elas cultuam, tratam como amigos, os sintomas,essas doenças já fazem parte do dia a dia, são as companheiras de viagem.

O contentamento ao desalinhar as características anatômicas, morfológicas , sintomáticas dos seus males, me fez entender o que é o amor!


“Ser doente é, pois, uma maneira de expressar-se no mundo, estabelecendo com ele relações específicas; neste sentido, dizemos que ela é polissêmica, pois as relações que um indivíduo estabelece têm significados múltiplos. E aqui podemos dizer ainda que o indivíduo 'escolhe'a doença como forma de expressão pessoal – ainda que, na maioria das vezes, a 'escolha' ocorra em um nível em que ele não tem consciência dela. A dor que a doença propicia pode ser preferível a outras dores, que seriam vivenciadas se a doença não surgisse. A dor da úlcera no estômago pode ser preferível à dor de despejar sua raiva sobre alguém; a dor de uma artrose, preferível à dor de se saber não mais amado. Além disso, a doença propicia um retorno das atenções do mundo sobre o doente; Freud chamou tal fato de benefício (ou ganho) da doença.
O doente é cercado de cuidados, os familiares se preocupam, os amigos vão visitá-lo, há um interesse genuíno pelo doente, todos querem saber 'como ele está' e fazem votos para o seu 'pronto restabelecimento'.

É fácil verificar o quanto a escolha pela doença pode ser sedutora. Ela redefine os contornos do reflexo no espelho, o doente ganha uma imagem e, às vezes, tal como Narciso à beira da fonte, apaixona-se por ela. Seduzido pela própria imagem de ser doente, seduzindo os outros pela doença de que padece, a dor se torna suportável, porque não mais implica a retirada do ser do mundo, mas justamente a alocação no mundo, em um ponto conhecido e controlado. Porém, seria um erro supor que o doente não sofre. Ao contrário, sofre e, muitas vezes, profundamente. Em primeiro lugar, porque ele não se tornou doente por vontade própria, nem está consciente dos benefícios que a doença lhe traz. Em segundo lugar, porque a doença é uma “opção” (ainda que inconsciente) desesperada de alguém que não encontrou outra possibilidade de se expressar e de se relacionar senão enquanto doente."
(OLIVER, VENANCIO,1999)

Ops! Eu tava lá também!


Referência:

OLIVER, G. G., VENÂNCIO, S. A doença e o doente: uma abordagem através dos mitos(1999). Disponível em http://www.unimep.br/phpg/editora/revistaspdf/imp22_23art07.pdf. Acesso em 21 de janeiro de 2009.

Um comentário:

Anônimo disse...

Lizandra, muito bom o post. Parafraseando um herói americano: "I have a dream" (Eu tenho um sonho). O sonho de que um dia as autoridades que lidam com a saúde vão se tocar que se elas colocassem um psicólogo para atenderos pacientes antes do médico, as filas dos hospitais públicos diminuiriam cerca de 70%, eu aposto.

Grande abraço!

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